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Hechos y delirios
Capitulo 8 - Watergate: A mentira

05/10/2022 00:00




­Capitulo 8 - Watergate: A mentira    (1974)

Quando todos realizam seu dever constitucional ou institucional, um presidente que mente não consegue permanecer como Chefe de Estado

A Lei venceu. O episódio Watergate mostrou que a lei deve ser respeitada por todos, até pelo presidente mais poderoso do Planeta.

Como então correspondente em Washington da agência Latin-Reuters eu tive a missão de escrever diariamente em espanhol sobre o episódio.

Começou em 1972 como mais uma notícia de polícia, nas páginas interiores dos jornais locais. Cinco pessoas foram detidas, supostamente ladrões, por invadirem o escritório do, na época opositor, Partido Democrata, instalada no prédio Watergate, junto ao rio Potomac, em Washington.

Semanas depois de publicada essa curta notícia policial, Nixon venceu facilmente as eleições presidenciais. Após a eleição o Washington Post começou a publicar uma série de matérias sobre a invasão da sede do Partido Democrata descartando a hipótese de uma ação isolada de marginais.

Fazia menos de um ano que eu tinha chegado a Washington para traduzir para os leitores latino-americanos o que acontecia na Roma dos tempos modernos, na definição de um diplomata da época.

Os repórteres Bob Woodward e Carl Bernstein assinavam matérias no Washington Post e que apontavam indícios de motivação política por parte da Casa Branca na invasão do Watergate. Esta, por sua vez, desmentia ou buscava desmerecer cada matéria por eles publicada. Pensei que os repórteres perderiam o trabalho. Nada.

O jornal ampliou a cobertura do caso afirmando ter fontes confiáveis. deixando claro que a Casa Branca tinha culpa no cartório e afirmava ter fontes confiáveis. Quando cresceu a pressão das autoridades contra o Washington Post, pensei que esse veículo poderia baixar o tom ou substituir os noticiários por trivialidades como havia acontecido ao sul do Equador.

Esse jornal teria se rendido aos milhões recebidos em publicidade governamental ou simplesmente seus jornalistas teriam sido. Nada

A fonte, depois conhecida como Deep Thoat ou Garganta Profunda (título de um conhecido filme pornô da época) debilitava as versões da Casa Branca com informações precisas. Em 2005 foi revelado que essa fonte era W. Mark Felt, o ex-Número Dois da Polícia Federal Americana (FBI).

Essa coragem da imprensa independente teve um efeito cascata. Os principais jornais dos Estados Unidos passaram a focar também no tema Watergate. A Casa Branca passou a atacar a mídia, quando nomes de assessores de Nixon eram relacionados mencionados à invasão da sede do partido democrata. Nada adiantou.

A agência Latin-Reuters queria evitar que detalhes de redação retirassem credibilidade de suas matérias porque pese a dominar perfeitamente o inglês, alguns dos acusados não estavam muito interessados em contar a verdade nua e crua.

O editor chefe para América Latina passou a revisar pessoalmente meus textos preparados com desgastante esforço por ter de interpretar minúcias legais colocadas por grandes especialistas em criar dúvidas e evitar as palavras "sim" ou "não".

No meu escritório no National Press Building, na 14th e F. Street, eu também estava preocupado com a possibilidade de ter qualquer problema com a todo-poderosa Casa Branca, onde era credenciado como correspondente estrangeiro, após passar pelo crivo do Serviço Secreto.

Lembrava que em América Latina, jornalistas eram assassinados, presos, espancados, por muito menos que escrever sobre possíveis ilegalidades do presidente mais poderoso do Planeta. Para me acalmar, lembrei que eram contados os casos de jornalistas assassinados em território dos Estados Unidos, procedimento até pouco utilizado pela própria Máfia. 

Apesar da tensão entre a Casa Branca e a imprensa na aceleração do processo testemunhei respeito entre as partes. Sem dúvida o respeito ao Estado de Direito tão cultivado nos Estados Unidos, nessa época, influenciava as decisões. Praticar jornalismo na América Latina, com esses parametros, seria muito menos perigoso. 

Quando Nixon cumpria um ano e meio no seu segundo mandato, novas informações ligaram assessores do presidente à ilegal invasão. Foi criado um Comitê de Investigação no Senado.

Foram apreendidas fitas gravadas na Casa Branca que indicavam, porém não provavam que o presidente tinha conhecimento das operações contra o partido de oposição, porém haviam sido editadas.

Assessores presidenciais do primeiro escalão renunciaram e foram convocados a depor perante o Comitê. Pensei que o público ia se cansar de acompanhar as cuidadosas palavras de juristas, advogados, assessores e senadores falando de leis, história, tradição e de ética. Mas não.

Uma grande audiência acompanhava a TV que transmitia diária e integralmente as longas sessões ao vivo. Muitos parlamentares democratas e numerosos republicanos concordavam que o presidente poderia apelar ao recurso Chefe do privilegio do Executivo e deixar de entregar fitas completas do que se passou no Salão Oval.

O cerco fechou em Washington. O Attorney General fez a sua parte com total isenção, imparcialidade e objetividade, como corresponde a um Procurador Geral de um país importante, sem qualquer procedimento de submissão ao Chefe do Executivo encurralado.

Em julho de 1974 a Suprema Corte, por unanimidade, obrigou Nixon a apresentar as gravações originais que comprovariam o seu conhecimento e envolvimento no crime. Duas semanas depois da decisão da Suprema Corte, Nixon renunciou.

Nixon livrou seu país do tormento de um demorado processo, desgastante para os três poderes. O vice Gerald Ford completou o mandato, com total normalidade e sem o caos que alguns profetizavam ao início do processo.

Os Estados Unidos saíram da paralisia provocada pela crise política que comprometia a sua economia e suas relações com o mundo. Acredito que o país ficou ainda mais forte para enfrentar os grandes desafios de uma superpotência.

Foi um claro exemplo que, quando os ocupantes das principais cadeiras dos Três Poderes cumprem seus deveres constitucionais e institucionais, a população recupera a confiança nas instituições e o país volta rapidamente aos trilhos.

Imagem: White House, Artranked



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