Marco acreditava no Destino Manifesto, ou basicamente, que os ricos são ricos porque foram indicados por um dedo divino e que os pobres são pobres porque não foram escolhidos. Assim esses não escolhidos merecem ser pobres e não devem receber qualquer ajuda do Estado, nem de ninguém.

Ele cresceu numa família abastada do sul do Brasil. Foi um estudante fraco porque se dispersava. Demorou, mas acabou se formando como advogado porem não pensou em exercer, nem estabelecer um escritório. Preferia passar o tempo especulando com moedas virtuais até perder  dinheiro ao investir na criptomoeda promovida pelo presidente argentino que admirava. Lamentava não ser um agente da CIA, AAA ou Mossad na ponta da ação.

Com o passar dos anos foi burilando seus principais pontos ideológicos. Ficou feliz de ter ingressado numa igreja, somente frequentada por brancos. A sua igreja era infatigável na estratégia de fragmentação social, depreciadora das instituições que praticam o laicismo assim como dos partidos autodenominados de progressistas.

Mas era pouco para ele. Marco se considerava homem de ação. "Por debater demais, estamos assim", refletia. Lamentava não ter nascido num país potência imperial. Mas podia fazer bastante.

Marco insistiu e insistiu até ser recebido por um adido de segurança do consulado da principal potência ocidental, em São Paulo. Não teve sucesso em que se interessassem imediatamente por seus serviços. Apenas recebeu como resposta: "fica registrada esta conversa para análise dos superiores".

No aguardo de uma resposta positiva, Marco se embrenhou no estudo de técnicas de sabotagem de todo tipo, de detectar pontos para incendiar bases de lançamento de foguetes, explodir pontes a introdução de materias toxicos para determinadas plantações vitais para a economia.

Cada dia também reforçava os pilares de sua ideologia de ódio. Assim repetia que os índios perderam suas terras por preguiçosos, que os africanos somente avançaram quando foram colonizados, que os palestinos mereciam sofrer por não aceitar o povo escolhido, que os asiáticos deveriam ficar longe do continente americano.

Passou a postar nas redes sociais boatos e mentiras para denigrar pessoas que lhe pareciam ser obstáculos a um projeto que considerava certo, o de privilegiar os que mereciam os privilégios. Trocava mensagens com membros de uma gangue racista do sul dos Estados Unidos, uma quase sucessora do Ku Kux Klan e escrevia sobre a sua enveja pela facilidade que eles tinham para comprar armas pesadas.

Também tentava se manter em forma, correndo e com ginástica praticada pelas forças especiais canadenses. Uma manhã após uma corrida na areia, foi atravessar pela faixa de pedestres a avenida que corre junto a praia do Balneário Camburíu. Um Lamborghini em alta velocidade o atropelou.

Marco ficou no asfalto por dois minutos, quando chegaram dois garis que limpavam o meio fio, para socorre-lo. A ambulância chegou cinco minutos depois de um deles chamar por auxílio. No hospital, uma junta médica de emergência foi preparada para analisar o caso de esse homem quase totalmente desfigurado pelo impacto.

Os médicos chegaram a rápida conclusão que as chances de salva-lo eram praticamente inexistentes, porque deveriam amputar as pernas, um dos braços, além de retirar um rim e um pulmão. Também deveriam retirar os testículos igualmente estraçalhados no impacto. Mas aprovaram que tentariam tudo porque ele não tinha sofrido dano cerebral e o coração batia sem estímulo externo.

A Dama de Preto todo viu e ouviu antes de abandonar o hospital. Programou para voltar por Marco... A Dama de Preto decidiu que voltaria por ele... na tarde de uma quinta-feira...passadas três décadas daquele momento.